Aos ministros do STF, meu repúdio

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Estou enojado! Ouvir da (suposta) mais alta corte do País que o Jornalismo não é tão vital para a sociedade quanto a medicina ou a advocacia me deixou assim. E me sinto no direito de “minusculizar” o “c” para mostrar minha indignação contra um Supremo Tribunal Federal (STF) digno de pena. Ou melhor, digno de nada.

Derrubar a exigência do diploma para o exercício da profissão jornalística foi um golpe não aos comunicadores, mas à democracia brasileira. A obrigatoriedade existia há 40 anos e foi implementada justamente na Ditadura Militar, num período em que a liberdade de expressão era reprimida ao extremo. A cobrança do diploma passou a ser feita para termos qualidade no que era comunicado.

Agora, qualquer chefe de cozinha ou costureiro – com quem um dos ministros chegou a nos comparar – vai poder ocupar uma cadeira de redação, apresentar-se como repórter ou editor e escrever e publicar textos levando em consideração o critério que julgar conveniente. Nós, jornalistas profissionais, passamos a ser, como bem definiu o presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sérgio Murillo de Andrade, “um amontoado”. Saímos do status de categoria.

Todo o meu reconhecimento à relevância dos médicos, advogados, cozinheiros e costureiros. Porém, não me sinto diminuído pelo fato de não trabalhar com bisturis, livros gigantescos contendo artigos e referências jurídicas, panelas ou agulhas e linhas. Eu trabalho com letras. E letras que são colocadas em ordem a partir de técnicas específicas não só de gramática, como alguns argumentaram durante a votação, mas de peso noticioso. Técnicas essas aprendidas apenas no calor da universidade. No nosso ramo, é impossível a escrita ser empírica.

Falar que escrever bem é um dom e alegar que nomes como Clarice Lispector e José de Alencar são mitos da literatura mesmo sem um diploma de Jornalismo é argumento fraco. Afinal, escritor é escritor; jornalista é jornalista. Eles não têm a menor obrigação de serem verdadeiros. Ao contrário. Muitas vezes, criam histórias para poderem vender livros e terem o que comer. Nós, jornalistas, juramos compromisso com a veracidade dos fatos que levamos a público. E não há nada de inconstitucional nisso.

Inconstitucional deveria ser termos ministros que desconhecem a realidade do “fazer” Jornalismo e, ainda assim, sentem-se cheios de conhecimento de causa para dizerem que exigir diploma fere a liberdade de imprensa e contraria o direito à livre manifestação do pensamento. Para mim, isso cheira a discurso em defesa de interesses escusos. Em defesa dos ditames dos grandes patrões, que seguem a linha do “quanto mais o “profissional” for submisso, mais eu exploro e faço dele o que bem entendo”.

Não é razoável pensar que uma certificação de ensino superior por si só dita quem pode ou não se comunicar. Ela não tem esse poder. Nem nunca terá. Afinal, como os próprios ministros ressaltaram, a comunicação é um direito universal; absoluto. E é mesmo. Não estamos contestando isso. Contudo, é essa certificação que me credencia a expor meu pensamento de forma qualificada. A falta dela, certamente levará os futuros “repórteres” a portarem-se de maneira inadequada diante da reprodução dos fatos, como já vimos em sessão do STF magistrado dizendo para o outro: “saia à rua, ministro. Vossa Excelência está na mídia, destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro”. Não é, Gilmar Mendes?

O jornalista profissional tanto é vital para a sociedade que os próprios ministros, quando têm a intenção de projetarem-se e autointitularem-se os arautos da moralidade , recorrem a nós para os colocarmos em grandes matérias. Ou então nos ameaçam por termos divulgado informações sigilosas que os expuseram a execrações públicas por suas ilicitudes.

Considero a medida uma falta de respeito a quatro décadas de luta; uma falta de respeito a figuras como a professora Adísia Sá, que tanto brigou pela implementação do curso de Jornalismo na nossa UFC e agora é apunhalada com esse golpe. Mais ainda, considero falta de respeito à população, que, em diversas pesquisas realizadas sobre o assunto, manifestou-se contra a derrubada do diploma.

Professora Adísia, à senhora, minhas estimas. Aos demais jornalistas do Brasil, meu consórcio de revolta. Ao povo brasileiro, meus desejos de que essa burrice um dia seja revertida por um Tribunal mais sério. Aos ministros do STF, meu repúdio. Sinto asco de Vossas Excelências. Como disse, estou enojado!

Bruno de Castro.
Jornalista Profissional.
E com orgulho de sê-lo.

14 comentários:

Dahiana Araújo disse...

Totalmente apoiado-- mais que repúdio, isso merece uma atitude de todos nós que dedicamos momentos precisoso a nossa formação, com empenho e esforço!

Artigo 10!

Andreh Jonathas disse...

belo comentário, Brunão,
agora, é lutarmos por um conselho que filtre minimamente a profissão
abraço

Adilson Nóbrega disse...

Não sei cozinhar, nem costurar... o jeito é eu me candidatar ao STF agora: é o único lugar onde analfabeto funcional pode ser até presidente.

Jardel Pereira (FGF) disse...

Bruno, adorei seu texto, tudo que falas nele é real e o apoio em todas as suas palavras, temos que fazer valer todos os nossos direitos, se nos formamos (seu caso) ou vamos nos formar (meu caso) merecemos reconhecimento e dignidade, infelizmente a nossa justiça é fraca e nossos ministros "analfaburros", abraços e vamos na luta pra continuarmos sempre assim, JORNALISTA FORMADO (como vc) e quase JORNALISTA FORMADO (como eu) na luta pela liberdade e direito de expressão para todos, passando as informações com precisão, coragem e imparcialidade, abraços meu amigo!

Lucia Stedile disse...

A quem pode interessar a decisão do STF? Aos politicos ora! É bem mais fácil lidar com ‘jornalistas’ sem compromissos éticos, pagar um jabá e ver publicado somente aquilo que interessa. No Brasil ainda não se acostumaram com a democracia. A mídia só é bem vinda para elogiar. Os caras cometem todo tipo de abuso, mas não aceitam críticas. E a culpa é sempre da imprensa. Eles roubam: a culpa é da imprensa porque divulgou. Eles empregam parentes: a culpa é da imprensa que escancarou a história.
Inda ontem o Lula dizia que o Sarney não pode ser tratado como uma pessoa comum, porque tem história. Realmente ele não é comum como nós. Eu, por exemplo, não posso empregar toda minha família no Senado. Ah, e ele tem história! Eu também tenho, todos temos. Minha história é que meu pai era um cara pobre e trabalhou pra caramba pra que eu estudasse e conseguisse esse diploma. E agora o STF jogou no lixo a minha história e a história do meu pai. Então, eu falo com quem? Com o Papa?
Bom, seguindo a lógica do STF, agora possa ser qualquer coisa. Decidi: vou ser diplomata do Itamaraty que pagam em dólar e a gente ainda pode trabalhar no exterior, longe das trevas que se abatem sobre o Brasil. Não topo ser ministra, deputada, senadora, vereadora, prefeita ou governadora. Sou ética, aprendi a ser ética com meu pai, e aprendi o que é Ética na faculdade, sim, aquela onde conquistei meu recém-usurpado diploma.

Lucia Stedile disse...

Olha Bruno,
Isso merece uma reflexão profunda.
A ironia das ironias, que você corajosamente colocou no seu comentário: "A obrigatoriedade existia há 40 anos e foi implementada justamente na Ditadura Militar, num período em que a liberdade de expressão era reprimida ao extremo".
E eu, que vivi essa ditadura, só posso me perguntar: que diabo de democracia é essa que conquistamos?

Beto Godoy disse...

Que tal brigarmos para que o STF, acabe com a exigência de diploma de medicina...Assim, poderiamos ressucitar os curandeiros, benzedeiras e ... Aí talvez esses "profissionais" das saúde tenham direito de expressão.
Penso que pessoas com dons superiores e indiscutiveis, deveriam ter espaço dentro das UTIs.
Parece um comparativo imaturo e burro?
Pode ser, mas como afirmou meu amigo Bruno, nenhuma das justificativas foram coerentes, foi feito o precedente. Vale a idéia...

Questão Fundamental disse...

Muito simples. Não se trata de mais nada senão uma troca de favores. O STF faz a vontade dos empresários da comunicação extinguindo a exigibilidade do diploma, e em contrapartida recebe um "não estou vendo nada" da mídia. A corrupção grassa porque este pais não tem lei. E não tem porque o Judiciário é o mais corrupto dos poderes.

Souto Filho disse...

Putz....na verdade não fiquei enojado...estou envergonhado com essa decisão. Hoje, chego em casa e minha mãe, preocupada com a decisão, perguntou se eu ainda sou um jornalista ou outra coisa.Do que valeu meus quatro anos de faculdade? Me deu um aperto no peito. Coitada dela e coitado de nós!!!

Pedro Alves disse...

A impressão que ficou clara pra mim é a de que os Nobres Ministros da Corte Suprema Brasileira não entendem "p*** nenhuma" sobre jornalismo. Deviam derrubar o próprio diploma (indignado!)

Amanda Ávila disse...

Estou partilhando do mesmo nojo!

Deborah Milhome disse...

Cara, ficou muito massa!!! Você falou nesse texto tudo o que nós estudantes e jornalistas estamos sentindo. valeu!!!

Anônimo disse...

Eu tô triste, foi um retrocesso muito grande! Mas, ainda assim, não vou desistir de terminar o meu curso, porque acredito que é importante estudar para ser jornalista! :*

Be Mind disse...

eu so sei que eu quero meu diploma, otimo texto amigo, sou de total acordo com tudo, e tenho a mesma opnião e sentimento